sábado, 28 de maio de 2011

O Fogo

Poema escrito aquando do  incêndio do Chiado em 25.08.1988



Lisboa
Não entoa
O seu pregão
Esta manhã;
Por gritar
Enrouqueceu...
E a guitarra
Portuguesa
Emudeceu...
Lisboa
Surgiu na madrugada
Mutilada
Pois o seu coração,
Ontem vibrante
Hoje, qual personagem
De Dante,
Agoniza em chamas!
Ah, Lisboa pombalina
Pudesses tu,
Como Fenix,
Renascer das cinzas...
Ou pudessem
As minhas lágrimas
Ter apagado
O foco
Dessa imensa fogueira...!

                                   
                               Eugénia Edviges


Um grande abraço


terça-feira, 24 de maio de 2011

Domingos Lobo

Domingos Lobo é programador cultural da Câmara Municipal de Benavente;
Faz parte do Grupo A Phala, de Santarém;
É coordenador do Prémio Nacional de Poesia Natércia Freire, instituido pela CM de Benavente;
Estudou Teatro no Conservatório Nacional;
Começou a publicar os primeiros textos no Diário de Lisboa-Juvenil;
Fez rádio nos antigos Emissores Associados de Lisboa;
Fez jornalismo, crítica de teatro e de cinema;
Dirigiu o Clube de Teatro de Luanda;
Dirige actualmente o SobreTábuas-Grupo de Teatro de Benavente;
Tem vários livros publicados, entre eles, alguns de poesia que, neste blogue, não podia deixar de referir.

Partindo de um tema a construção civil, Domingos Lobo desenvolve os poemas que formam o corpo deste livro. As ilustrações são óleos sobre tela e desenhos aguarelados de A.J. Costa e Silva

A pedra

é de lioz a pedra
eterno parapeito da janela de onde avisto o Tejo
pousada na varanda às imtempéries
na minha velha casa
suspensa como um astro
nela me debruço
e revejo
a cidade que do outro lado se agita
há tanto tempo está ali
a pedra
que nela o meu corpo se moldou

cairemos os dois
um dia
sobre o asfalto



Ora agrestes e provocadores, ora magoados e amargos, líricos, realistas ou impressionistas, os seus versos ou prosa poética, a fazerem lembrar Cesário Verde, Alexandre O`Neill e Herberto Helder, tocam-nos pela força e profundidade com que estão escritos. (Nota dos editores)

acaso 2.

mete-se de permeio o tempo
envelhecemos é isso
sem retorno sem remisso
atados ao pensamento

mete-se um frio pela fresta
da pele e sobe à espinhela
caem sonhos da janela
cai-nos por fim o que resta

intempestivos e azedos
ficamos de gestos presos
na rua a olhar o vento

dói-nos o sangue e o lento
declinar dos sentidos
cravamos na carne os dentes pra cuidar que estamos vivos.





Trata-se de uma antologia poética portuguesa erótica, burlesca e satírica do século XVIII. Selecção, prefácio e notas de Domingos Lobo. Ilustrações de Dorindo de Carvalho. O soneto que eu escolhi é da autoria de António Lobo de Carvalho, que nasceu em 1730 e faleceu em 1787. É um diálogo entre um penitente freirático e um confessor casmurro:

A um fradalhão bojudo e rabugento
Seus crimes confessava um desgraçado
E entre eles dizia ter pecado
Com uma santa freira num convento:

Grita o frade: "Não tardam num momento
Raios mil, que subvertam tal malvado;
Que as esposas de Cristo há profanado
No santo asilo seu, sacro aposento!
Ora diga, infeliz, como ousaria
Tal crime confessar, e acções tão brutas
A Jesus Cristo, lá no extremo dia?..."

"Padre, deixemos pois essas disputas;
Se ele me perguntasse, eu lhe diria:
Quem vos manda senhor, casar com putas?"


Não posso descurar a prosa de Domingos Lobo. Refiro algumas obras:

Quando os Medos Ardem - teatro
Os Navios Negreiros não Sobem o Cuando - romance
Pés Nus na Água Fria - romance
Território Inimigo - contos
Desconstrutor de Neblinas - vários textos
Cenas de Um terramoto - teatro
Não Deixes que a Noite se Apague - teatro


Vale a pena partir à descoberta da escrita de Domingo Lobo

Um grande abraço



segunda-feira, 23 de maio de 2011

Inacessível



_ Avó, quero espreitar àquela janela...
_ É feio, filha...
_ Avó, quero espreitar...Há tantos livros...

E a janela surgiu
Como moldura de vida:
Histórias, pedaços de gente,
Corpos de palavras...
Que grandiosidade!

_ Vamos filha, é feio...

A velhota parou
Frente à vidraça.
E olhando o vácuo,
Pensativa,
Tenta compreender
O que é que ilumina
Os olhos verdes da sua neta...


                                      Eugénia Edviges


Um forte abraço!

sábado, 21 de maio de 2011

As Letras Que Eles Cantam -Praia das Lágrimas

Praia das Lágrimas - Rui Velozo/Carlos Tê

Ó mar salgado eu só sou mais uma
das que aqui choram e te salgam a espuma

Ó mar das trevas que somes galés
meu pranto intenso engrossa as marés

Ó mar da India lá nos teus confins
de chorar tanto tenho dores nos rins

Choro nesta areia salina será
choro toda a noite seco de manhã

Ai ó mar roxo ó mar abafadiço
Poupa o meu homem não lhe dês sumiço

Que sol é o teu nesses céus vermelhos
que eles partem novos e retornam velhos

Ó mar da calma ninho do tufão
que é do meu amor seis anos já lá vão

Não sei o que os chama aos teus nevoeiros
será fortuna ou bichos-carpinteiros

Ó mar da China, Samatra e Ceilão
Não sei que faça sou viuva ou não

Não sei se case notícias não há
será que é morto ou se amigou por lá



Um abraço

terça-feira, 17 de maio de 2011

Demência


Dementes, navegamos
Nas ondas do nosso mar.
No quadro da janela
Surge a luz do poente
Que molda o teu corpo suado
Sobre o meu corpo rasgado
Em verso.
Somos guerreiros enraivecidos
No aconchego do Universo.


                                      Eugénia Edviges


Um abraço

domingo, 15 de maio de 2011

Prémio Camões 2011

- O escritor português Manuel António Pina recebeu o Prémio Camões 2011, o mais importante galardão de língua portuguesa.
Em declarações à agência Lusa, Manuel António Pina afirmou que a atribuição do prémio era «a coisa mais inesperada que eu poderia esperar» acrescentando que «nem sabia que o júri estava reunido».

Manuel António Pina, de 67 anos, nasceu na Beira Alta, e formou-se em advocacia antes de começar a trabalhar como jornalista. É poeta, autor de livros infantis e tradutor. 
O prémio, é pago pelos governos do Brasil e de Portugal, que o instituíram em 1988. Desde a sua criação foram laureados dez portugueses nove brasileiros, um moçambicano, um cabo-verdiano e dois angolanos.


Alguns livros de poesia de Manuel António Pina:

Aquele Que Quer Morrer
Os Livros
Poesia Reunida
Gatos
Cuidados Intensivos
Nenhuma Palavra, Nenhuma Lembrança (que inclui o seguinte poema):


A um Jovem Poeta  
Procura a rosa.
Onde ela estiver
estás tu fora
de ti. Procura-a em prosa, pode ser

que em prosa ela floresça
ainda, sob tanta
metáfora; pode ser, e que quando
nela te vires te reconheças

como diante de uma infância
inicial não embaciada
de nenhuma palavra
e nenhuma lembrança.

Talvez possas então
escrever sem porquê,
evidência de novo da Razão
e passagem para o que não se vê.

Um abraço poético

sexta-feira, 13 de maio de 2011

O Nosso Rio

Mesmo que os sonhos atirados com os seixos
Não se realizem
Por não circularem em anéis prateados.

Mesmo que a aragem que envia ao nosso rosto
Nos faça chorar.

Mesmo que se vislumbrem
Só disformes fantasmas
Que caminham nas suas margens.

Mesmo que já não se oiçam risos
Nem beijos sublimes
Em lábios entrelaçados na folhagem.

Mesmo que as margens recuem
E mostrem toda a podridão
Escondida no leito.

Mesmo que a destruição nos sufoque.

Mesmo que os salgueiros gritem
E já não tenham sombra para nos abraçar,


É o nosso rio!

                                          Eugénia Edviges



Um abraço saudoso

Sob Aquela Árvore da Minha Infância


Sob aquela árvore da minha infância
Pairam fantasmas de risos e lágrimas.
E o tempo ausente
Pressente em mim
Uma voz dolorida.


Sob aquela árvore da minha infância
Ouvem-se cantigas de embalar.
E o baloiço dança...
Balança o meu corpo
Nas voltas da vida.


Sob aquela árvore da minha infância
 Procuro rever imagens de outrora.
 Lanço os meus braços,
 Passos dou em vão
 Na paisagem perdida. 


                                  Eugénia Edviges

Um abraço apertadinho
 

terça-feira, 10 de maio de 2011

GRITOS


Se o pensamento voa
Em voos irregulares,
Em sonhos maus e vulgares,
Escrevo versos.

Se tudo é triste e cinzento
Em dias de sol brilhante
Se a voz é muda-gritante
Escrevo versos.

Se a dor me atormenta
E o peito chora de mágoa,
Se os olhos estão rasos de água
Escrevo versos.

Frementes, meus versos são gritos
Marcados à flor da pele
E o bode expiatório
É a folha de papel!

                                   Eugénia Edviges

Um abraço gritante

domingo, 8 de maio de 2011

O Livro do Sapateiro



Foi com este título que Pedro Tamen conquistou o Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores. Com ele também venceu, em Fevereiro, o prémio Correntes d`Escritas. Está editado pela D. Quixote.




Iremos procurar a razão da giesta
a razão do amarelo
iremos procurar a razão
iremos procurar
e os olhos tomarão todas as cores
as cores de tudo






 Um abraço como prémio

Em Jeito de Metáfora


Bateram à minha porta
Toc, toc, de mansinho
Como temendo ofender
Este meu isolamento.
E eu imóvel, a urdir
Pensamentos dilacerantes.
Não abro. Não apareço…
Será alguém que me traz
A árvore da minha infância
Só para me proteger
Daquilo que não esqueço?
Mas porquê tentar esconder
Sombras que são indeléveis?
Será alguém a querer
Do meu peito a amizade
Por vislumbrar nos meus olhos
O chamamento da alma?
Mas porquê bater à porta
Se tenho os braços abertos?
E será que há um motivo
Para alguém bater assim…?
…Devia ter ido abrir.
Quem sabe, talvez levasse
Os fantasmas do passado
Que moram dentro de mim!

                              Eugénia Edviges


Um abraço 

quinta-feira, 5 de maio de 2011

MANHÃ


Afaguei o cabelo da aurora
Que me acordou,
Inundando
A praia do meu corpo
Na maré branca de linho...
Meu corpo
Que não tem história
Nem raízes de mágoa
Nem rios rebeldes,
Fugidios!

Sem pudor, sorri.

Convicta
Mostrei-me nua
Ao sexo com hora.
E na fúria dos sentidos
Revivi!


                    Eugénia Edviges


Um grande abraço

segunda-feira, 2 de maio de 2011

IMAGENS


Quero vislumbrar
O chão da ameixoeira
Que tinha o baloiço
E a sua sombra a dançar
Com o meu corpo de criança,
Ou as figueiras com os ramos
A roçar a terra escura e fértil,
Ou os caminhos de terra batida
Marcados pelos pés de gente querida.
Quero escutar
Os pombos a arrulharem
Ao redor dos ninhos no velho poço,
Ou o murmúrio da água
Escorrendo pelos sulcos
Para regar o sustento…

Nada distingo
No espaço aberto ao céu
Que foi só meu.
O tempo, carrasco, mudou
A forma das coisas:
Não vejo o baloiço
Nem a ameixoeira.
As figueiras esqueléticas
Oram ao céu.
Nos caminhos crescem ervas daninhas
Por não serem calcados há muito
Pelos pés de gente querida
O velho poço, em ruínas,
Já sem arrulhos de vida.

Consigo reter
Rostos cansados mas sorridentes
E mãos calosas com ternuras e afagos
Na minha mente.
São imagens sempre lembradas
Que acalmam os sentidos
Do meu corpo ausente…

                                  Eugénia Edviges


Um abraço saudoso

Dou-te Um Verso

Uma agenda intemporal deveras interessante. Dá para ler todos os dias do ano e para todos os anos.Edição Babel. Tem excertos de poemas de Al Berto, Alberto Caeiro, Alexandre O`Neill, Eugénio de Andrade, Jorge de Sena,  José de Almada Negreiros, José Régio, Manuel Alegre, Mário Cesariny, Sofia de Mello Breyner e muitos outros. Um para cada dia.

"Um ano é feito de muitos dias. de trezentos e sessenta e cinco (ou seis, às vezes), mas também dos que vivemos (no presente), dos que vivemos (no passado), ou dos que viveremos (no futuro) e que fazem de cada dia uma experiência única. Que estes versos oferecidos sejam sempre versos reflectidos - para perto, para longe, para dentro. De maneira a que sorria, chore, se indigne ou apaixone com os versos que lhe oferecemos para toda a vida" Os Editores


Cai o silêncio nos ombros e a luz impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer. - Eugénio de Andrade

Quando eu nasci, as frases que hão-de salvar a humanidade já estavam todas escritas, só faltava uma coisa - salvar a humanidade. - José de Almada Negreiros

És tu a Primavera que eu esperava,
a vida multiplicada e brilhante,
em que é pleno e perfeito cada instante. - Sofia de Mello Breyner

O portugal futuro é um país
aonde o puro pássaro é possível. - Ruy Belo

Aqui, diante de mim
Eu, pecador, me confesso
De ser assim como sou.
Me confesso o bom e o mau
Que vão ao leme da nau
Nesta deriva em que vou. - Miguel Torga

Mas rezo sempre, como o fio da fonte
Teima na rocha viva ao mar virada
Na esperança de que um cântaro desponte. - Vitorino Nemésio

E tu entre corais, náufraga e nua,
a boiar no meu peito à luz da lua. - Vasco Graça Moura

Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça
há sempre alguém que semeia
canções no vento que passa. - Manuel Alegre

E mais trezentos e tal....



Um abraço condensado num poema
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